Nos anos 1990 e 2000, diversos animes populares como Pokémon, Digimon, Yu-Gi-Oh!, Death Note e Naruto foram considerados “satânicos” ou proibidos por pais e líderes religiosos no Brasil e na América Latina, principalmente por falta de conhecimento cultural e pelas temáticas sobrenaturais, violência ou símbolos religiosos que apareciam nas histórias.
A chegada dos animes ao Brasil entre as décadas de 1990 e 2000 marcou uma geração inteira de fãs. Porém, junto com o sucesso de títulos que se tornaram verdadeiros clássicos, veio também um movimento contrário: muitos desses desenhos japoneses foram taxados como “satânicos”, “do diabo” ou simplesmente inadequados para crianças. Isso aconteceu não só por conta das temáticas religiosas, mágicas ou sobrenaturais, mas também pela falta de conhecimento dos pais e líderes religiosos sobre o que realmente estava sendo mostrado.
O resultado? Milhares de crianças foram proibidas de assistir a animes que hoje são considerados cultuados e até mesmo obras-primas da animação. Se você não foi proibido de assistir, certamente conheceu alguém que não podia sequer mencionar esses títulos em casa.
Pokémon e Digimon

Nos anos 1990, poucos animes foram tão populares quanto Pokémon e Digimon. Porém, o sucesso veio acompanhado de muitas críticas vindas de comunidades religiosas. Para muitos líderes, os “monstrinhos de bolso” e suas evoluções eram uma forma de demonização infantil.
O problema não estava apenas no anime, mas também nos jogos de Game Boy e nas cartas de Pokémon TCG, que se tornaram febre no mundo todo. Pastores e grupos religiosos afirmavam que as criaturas eram “pequenos demônios disfarçados de fofura” que afastavam crianças dos valores cristãos. Digimon acabou entrando no mesmo pacote por trazer conceitos de “digievolução” e criaturas fantásticas, reforçando ainda mais a ideia de que havia algo “do mal” por trás da obra.
Apesar da polêmica, tanto Pokémon quanto Digimon sobreviveram às acusações e se consolidaram como ícones culturais, mas a perseguição deixou marcas em uma geração que precisou se esconder para assistir seus episódios favoritos.
Yu-Gi-Oh! e o “baralho do diabo”

Se tem um anime que ficou marcado como “satânico” no Brasil, esse anime é Yu-Gi-Oh!. Lançado no início dos anos 2000, a obra apresentava duelos de cartas mágicas e um protagonista possuído pelo espírito de um faraó egípcio. Essa combinação foi combustível suficiente para que igrejas e programas de televisão demonizassem a franquia.
O caso mais famoso aconteceu em 2003, quando o apresentador Gilberto Barros declarou ao vivo que o jogo de cartas de Yu-Gi-Oh! era “o baralho do diabo”. A fala gerou grande comoção, levando pais a proibirem seus filhos de jogar e até mesmo assistir ao anime.
Ironicamente, essa polêmica só aumentou a curiosidade das crianças, que passaram a enxergar Yu-Gi-Oh! como algo proibido e, portanto, ainda mais atrativo.
Death Note e o “caderno demoníaco”

Diferente de outros títulos desta lista, Death Note chegou mais tarde, em 2008, mas rapidamente ganhou destaque – e também polêmicas. A história de Light Yagami, um jovem que encontra um caderno capaz de matar qualquer pessoa cujo nome seja escrito nele, foi considerada chocante e perigosa para adolescentes.
No Brasil, o caso chegou a outro nível quando, em 2021, a TV Record denunciou o anime, chamando-o de “obra demoníaca” e alegando que poderia influenciar jovens a cometer crimes. O “Caderno da Morte” se tornou sinônimo de objeto proibido em muitas casas, especialmente entre famílias religiosas.
Ainda assim, a profundidade da narrativa e suas reflexões sobre justiça e moralidade transformaram Death Note em um clássico incontestável, mesmo com a polêmica que o acompanha até hoje.
Naruto e os jutsus proibidos

Pode parecer absurdo hoje, mas até mesmo Naruto foi considerado um anime “do diabo” por muitos pais e professores nos anos 2000. A série mostrava jovens ninjas treinando técnicas conhecidas como jutsus, algumas delas com símbolos de invocação, o que foi suficiente para despertar suspeitas em comunidades religiosas.
Além disso, o fato de o protagonista carregar dentro de si a Raposa de Nove Caudas, Kurama, fez com que muitos líderes religiosos acusassem o anime de incentivar pactos demoníacos.
A violência da obra também foi alvo de críticas. O Ministério da Justiça chegou a obrigar o SBT a exibir o anime apenas à noite, em vez da manhã, além de cortar cenas consideradas pesadas demais para o público infantil.
Yu Yu Hakusho e o sobrenatural
Outro grande sucesso da década de 1990, Yu Yu Hakusho também não escapou da perseguição. A trama mostrava Yusuke Urameshi, um adolescente que morre atropelado e se torna um detetive espiritual, investigando casos ligados ao mundo sobrenatural.
O enredo, que envolvia Céu, Inferno e demônios, gerou desconfiança entre pais conservadores. Além disso, um dos personagens carregava uma suástica budista na testa, que precisou ser alterada pela TV Manchete para evitar confusões com o símbolo nazista.
Apesar das polêmicas, Yu Yu Hakusho é lembrado até hoje como um dos animes mais queridos da década de 90.
Shaman King e o xamanismo

Se o nome já não fosse suficiente para gerar controvérsia, Shaman King trouxe ainda mais polêmicas por explorar diretamente práticas religiosas alternativas. O anime acompanha Yoh Asakura, um jovem xamã que treina para se tornar o Rei Xamã, em um torneio espiritual repleto de invocações e rituais.
Em países de tradição católica, como o Brasil, essa temática foi recebida com resistência. Muitos pais proibiram seus filhos de assistir ao anime por acreditarem que incentivava práticas ocultistas.
Cavaleiros do Zodíaco e os deuses pagãos

Um dos maiores fenômenos dos anos 90, Cavaleiros do Zodíaco também não escapou da censura. O anime foi acusado de promover símbolos “pagãos”, já que sua narrativa envolvia deuses gregos, signos astrológicos e batalhas cósmicas.
Além da temática, a violência explícita do anime preocupou pais e autoridades. A TV Manchete precisou cortar algumas cenas de sangue para manter a exibição nas manhãs, mas mesmo assim o anime continuou sendo alvo de críticas.
Neon Genesis Evangelion e as imagens bíblicas

Talvez o anime mais controverso da lista seja Neon Genesis Evangelion. Lançado em 1995, a obra de Hideaki Anno mistura mechas, filosofia, saúde mental e inúmeros símbolos religiosos.
Com referências a Adão, Lilith, anjos e passagens bíblicas, Evangelion foi atacado por repórteres latino-americanos. Em 2000, a jornalista mexicana Dolores Vega chegou a taxar o anime de “satânico”, reforçando a ideia de que a animação japonesa representava perigo para os jovens.
Até hoje, Evangelion continua sendo um anime desafiador, que divide opiniões, mas também é considerado uma obra-prima pela crítica especializada.
Dragon Ball e as críticas religiosas
Um dos maiores ícones do mundo dos animes, Dragon Ball também sofreu acusações de ser “satânico” nos anos 1990 e 2000. A série foi alvo de críticas principalmente por três motivos: a violência das lutas, as transformações que lembravam possessões demoníacas e a presença de personagens ligados a deuses ou entidades sobrenaturais, como Kami Sama e Majin Buu.
Além disso, o humor do anime – que muitas vezes envolvia cenas consideradas inapropriadas para crianças – incomodou pais mais conservadores. Em algumas escolas e congregações religiosas no Brasil, Dragon Ball foi proibido de ser comentado ou exibido, sendo acusado de influenciar negativamente os jovens.
Apesar das polêmicas, Dragon Ball não só sobreviveu às críticas como se tornou um dos maiores fenômenos da cultura pop mundial, com fãs de diferentes gerações até hoje.
InuYasha e os demônios do folclore japonês

Outro anime que enfrentou críticas nos anos 2000 foi InuYasha. A obra mistura ação, romance e elementos do folclore japonês, com personagens humanos convivendo com demônios (yokais) e sacerdotisas. Justamente por trazer tantas criaturas espirituais, invocações e lutas contra forças sobrenaturais, o anime foi acusado de promover bruxaria e pactos demoníacos.
Para muitas famílias religiosas, ver Kagome viajando no tempo e se aliando a um meio-demônio como InuYasha era motivo de proibição imediata. A presença de vilões como Naraku, que manipulava poderes malignos, só reforçou a ideia de que o anime tinha mensagens “do mal”.
Ainda assim, InuYasha conquistou fãs no mundo inteiro e hoje é lembrado com carinho como um dos grandes clássicos do início dos anos 2000.
O que esperar daqui pra frente?
As polêmicas em torno de animes nos anos 1990 e 2000 mostram o quanto o desconhecimento cultural pode influenciar a forma como obras de entretenimento são recebidas. Muitos desses títulos foram proibidos simplesmente por apresentarem conceitos diferentes do que era conhecido no Brasil, como espiritualidade oriental, referências religiosas ou temas maduros.
Hoje, a visão mudou bastante: animes se consolidaram como parte da cultura pop global e são respeitados como formas de arte. Obras antes consideradas “do diabo” são agora clássicos celebrados em eventos, convenções e até plataformas de streaming.
E você? Foi proibido de assistir algum desses animes ou conheceu alguém que passou por isso?